Heleno, o jogador que virou mito com fim trágico e Santoro imortalizou nas telas

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Rodrigo Santoro interpretando Heleno de Freitas.
Rodrigo Santoro interpretando Heleno de Freitas.

Era 1958 quando, com dois gols seus, o então jovem Pelé, de apenas 17 anos, levou a seleção brasileira à vitória por 5 a 2 sobre a Suécia e à conquista da Copa do Mundo. Para milhões de compatriotas do maior jogador de futebol do mundo, aquele era o momento de sair às ruas e comemorar.

O “fantasma” do “Maracanazo” já não assombrava mais a “Seleção”, que finalmente alcançava o topo do mundo. No entanto, essa conquista não foi motivo de alegria para todos. Enquanto em cada canto do país via-se rostos em êxtase, na clínica psiquiátrica de Barbacena se desenrolava um drama.

O lendário Heleno de Freitas, que havia se tornado uma sombra de seu antigo eu, aquele que enchia as redes nos campos cariocas, sofria um choque. Sabia que, no lugar de Pelé, poderia estar ele. Talvez o destino realmente tivesse planos grandiosos para ele, mas foi o próprio Heleno quem tratou de destruí-los.

O que aconteceu com Heleno de Freitas?

Há várias versões sobre o que aconteceu no hospício onde Heleno passou seus últimos anos de vida. Alguns dizem que colocou um maço inteiro de cigarros na boca e os acendeu de uma só vez. Uma enfermeira correu para ajudá-lo antes que algo pior acontecesse.

Outros contam que o ex-jogador do Botafogo, em estado de surto, começou a mastigar e engolir recortes de jornais com seus feitos dos tempos de glória, lá na década de 1940, quando era idolatrado e tinha o mundo aos seus pés.

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A história de Heleno de Freitas

A história trágica de Heleno de Freitas.

A história da vida de Heleno foi muito diferente do que alguém poderia imaginar ao conhecer apenas seu fim. Ele não conheceu a pobreza nem cresceu em favelas, como a maioria dos jogadores da Seleção.

Veio de uma família abastada, estudou Direito e logo passou a frequentar os círculos da alta sociedade carioca. Másculo, boêmio e talentoso jogador de futebol, não demorou a se tornar assunto constante e objeto de inveja.

Como atacante, com um senso de gol diferenciado, começou a fazer história com a camisa do Botafogo. Para os botafoguenses da época, era um Deus, e ele mesmo tinha grandes planos para o seu futuro. Sonhava, e não sem razão, em um dia levar a Seleção à conquista de uma Copa do Mundo.

Mas com a humanidade enfrentando o flagelo da Segunda Guerra Mundial, as Copas de 1942 e 1946 foram canceladas. Heleno viu suas oportunidades se perderem em meio à fumaça dos campos de batalha. Ainda assim, continuou marcando gols incansavelmente (204 gols em 233 jogos entre 1940 e 1948), mas percebia que seu sonho se tornava praticamente impossível.

Na mesma época, o carismático dentro e fora de campo Heleno adotava um estilo de vida totalmente oposto ao que se esperava de um atleta profissional, algo que todo técnico detesta. Mulherengo, jogador inveterado e amante da boa vida, era praticamente imbatível. Mas suas atitudes ainda não tinham lhe trazido consequências graves. Quando, porém, entram na equação os vícios de todo tipo, era só uma questão de tempo até começar a queda e o caminho para a destruição.

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O que diziam sobre ele

O escritor uruguaio Eduardo Galeano, grande admirador do futebol e dos heróis populares, escreveu sobre Heleno:

“É óbvio que ele tinha a alma de um cigano. Em campo, irradiava luz. Tinha o rosto de Rodolfo Valentino e o temperamento de um cão raivoso. Uma noite, num cassino, perdeu uma fortuna. E outra noite, quem sabe onde, perdeu a vontade de viver.”

Outro gigante da literatura, Gabriel García Márquez, que conheceu Heleno quando ainda era um jovem jornalista desconhecido, o descreveu assim:

“Ele não era apenas um centroavante. Era um motivo constante para falar e pensar mal dele.”

Os torcedores o adoravam. Mas o mesmo não se podia dizer de seus companheiros ou das diretorias. Os episódios controversos em que se envolveu são inúmeros.

Certa vez, reagiu às vaias do público abaixando o calção e mostrando onde, exatamente, os “guardava”. Em outra ocasião, foi-lhe pedido que motivasse o time após uma derrota. Em vez disso, criticou os colegas, dizendo que não eram tão bons quanto ele e os culpou diretamente por o Botafogo ficar quatro anos seguidos em 4º lugar no campeonato carioca.

E quando o clube cansou de suas atitudes e o transferiu para o Vasco (e justamente naquele ano, o primeiro sem Heleno, o Botafogo foi campeão!), ele chegou ao ponto de sacar uma arma e apontá-la para o rosto do treinador, porque este havia exigido mais empenho e dedicação nos treinos…

O fim de Heleno de Freitas

De qualquer forma, desde o fim da década de 1940, Heleno já estava em declínio. Viciado em éter, andava com um lenço embebido para cheirar onde estivesse. Ao mesmo tempo, experimentava outras substâncias, enquanto suas noites terminavam abraçado a garrafas de álcool e mulheres.

Dos primeiros, herdou o alcoolismo; das segundas, a sífilis. A contagem regressiva havia começado…

Abalado pelo fato de nunca ter conquistado um título (com a Seleção Brasileira foi duas vezes vice-campeão da Copa América), percebeu que não seria convocado para a Copa do Mundo de 1950, justamente aquela disputada nos gramados onde brilhou na década anterior.

Esperou a vida inteira por esse momento, mas estava ausente no maior encontro da sua vida. A partir daí, não houve mais volta.

Com a saúde cada vez mais debilitada, o brilho de Heleno apagava-se aos poucos. Os abusos, combinados com a depressão, a sífilis e a demência, seu próximo golpe, o afastaram não tanto do futebol quanto da vida comum. Internado em uma clínica psiquiátrica, passou a ter surtos frequentes, delírios de grandeza e sobreviveu por seis anos com a ajuda de seu irmão. No final, porém, ninguém mais podia ajudá-lo. Com a mente perdida, faleceu em 1959.

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Uma tragédia grega nos campos e nas telas de cinema

A história de Heleno de Freitas, que parece ter saído das páginas de uma tragédia grega, virou filme e retrata um homem dotado de tudo: talento, beleza, fama, riqueza. No entanto, como muitos heróis da mitologia antiga, se deixou levar por suas paixões, não conseguiu controlar suas forças e acabou sendo vítima de sua própria personalidade.

Essa vida arrebatadora foi levada ao cinema no filme “Heleno”, onde o ator brasileiro Rodrigo Santoro interpreta com impressionante intensidade o “príncipe” do Rio. O filme consegue retratar com maestria a ascensão e queda de um homem que não foi feito para suportar o peso do próprio mito.

O longa não é somente uma biografia esportiva. É um retrato da autodestruição. Heleno, em vez de se tornar o “Pelé” antes de Pelé, em vez de vestir a camisa da seleção canarinha e erguer troféus, desperdiçou seu dom. Encantador, genial com a bola nos pés, mas também incontrolável, arrogante e mergulhado em drogas, álcool e relacionamentos sem saída.

A vida de Heleno de Freitas é uma história sobre como o talento não basta. Como o mito é construído com dificuldade, mas desmorona com facilidade. Como a glória sem caráter é apenas uma armadilha. E, acima de tudo, é um lembrete de que por trás dos holofotes e dos gols, há sempre um ser humano, vulnerável, solitário e, no fim, trágico.

O “príncipe” do Rio poderia ter sido o rei do mundo. Mas, no fim das contas, estava escrito que o rei seria outro: Pelé…

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Desde pequena, sempre fui movida por duas paixões: as palavras e o desejo de conhecer o mundo. Me formei em Letras porque escrever sempre foi minha forma favorita de me expressar. Hoje, no Mundo Igual, tenho a sorte de unir isso ao que mais amo: contar histórias sobre viagens, culturas, notícias, dicas e experiências que nos transformam. Gosto do que é simples e verdadeiro. Prefiro uma caminhada no meio do mato a horas em frente à tela. A natureza me acalma, me inspira, e é dela que muitas das minhas ideias nascem. Não sou muito fã de tecnologia, mas acredito que, quando bem usada, ela pode aproximar pessoas e abrir caminhos.Escrevo como quem conversa. Compartilho lugares, curiosidades e tradições com o coração aberto, sempre tentando mostrar que o mundo é feito de encontros, diferenças e aprendizados. E se, de alguma forma, meus textos tocarem alguém ou despertarem a vontade de explorar algo novo, então já valeu a pena.

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